terça-feira, 30 de outubro de 2012

Diante do mau uso do personagem em A Liga Extraordinária, O Retrato de Dorian Gray (Dorian Gray, 2009) seria um bem-vindo retorno do jovem eterno ao cinema, mas o filme do diretor londrino Oliver Parker também não faz justiça ao único romance de Oscar Wilde (1854-1900). Frase atribuída a Wilde: todo autor, em seu primeiro romance, coloca-se como Cristo ou Fausto no lugar do personagem. A história de Dorian Gray - rapaz da alta sociedade inglesa no século 19 que tem seu retrato pintado por um artista e, encantado com a sua própria beleza na tela, pede em voz alta que nunca envelheça - tem as características de um pacto faustiano com o diabo. O teor religioso, porém, é marginal no livro. O Fausto de Goethe só serve a Wilde como um arquétipo. O problema do filme de Parker é abraçar a interpretação faustiana, a mais imediatista, e colocar de canto as discussões em que Wilde estava de fato interessado, sobre estética versus moral e especialmente sobre alteridade, as nossas relações de troca com o outro e a relação do objeto artístico com o seu apreciador ("na realidade, a arte reflete o espectador, e não a vida", diz Wilde no prefácio do livro). Como discutir a arte parece fora de moda nestes tempos obscurantistas em que vivemos, a opção de Oliver Parker pela interpretação mística pode ter apelo junto ao público. Em O Retrato de Dorian Gray, o diretor trabalha com elementos triviais do suspense sobrenatural, bem conhecidos do espectador, da mansão mal-assombrada aos gritos guturais e flashbacks em preto-e-branco. A clicheria se completa com o bigodinho de diabo de Colin Firth e a tentação da serpente no bacanal com música africana. Moralista, o filme torna fato tudo aquilo que o livro apenas sugeria (o homoerotismo, a confissão dos pecados) e simplifica passagens que antes davam profundidade aos personagens, como a morte de Sibyl - que no livro Dorian compara, ao seu modo esteticista, com "a terrificante beleza de uma tragédia grega". No filme, o ator Ben Barnes, o Dorian da vez, reage a esse episódio com as caretas de que dispõe, vítima de um texto que já chega para ele bastante depreciado. Ironicamente, O Retrato de Dorian Gray, com seu perfeccionismo britânico na ambientação, nos figurinos e nas maquiagens, mas raso em conteúdo, ilustra uma das questões que Wilde levanta no romance, a das obras de arte belas por fora e ocas por dentro. Se o filme motivar as pessoas a lê-lo, já terá cumprido o seu papel. Veja mais em: http://omelete.uol.com.br/cinema/o-retrato-de-dorian-gray-critica/

quinta-feira, 5 de julho de 2012